quinta-feira, 29 de maio de 2014

‘Meditação do Duque De Gandia sobre a morte de Isabel de Portugal’




Nunca mais 
A tua face será pura limpa e viva 
Nem o teu andar como onda fugitiva 
Se poderá nos passos do tempo tecer. 
E nunca mais darei ao tempo a minha vida. 
Nunca mais servirei senhor que possa morrer. 
A luz da tarde mostra-me os destroços 
Do teu ser. Em breve a podridão 
Beberá os teus olhos e os teus ossos 
Tomando a tua mão na sua mão. 
Nunca mais amarei quem não possa viver 
Sempre, 
Porque eu amei como se fossem eternos 
A glória, a luz e o brilho do teu ser, 
Amei-te em verdade e transparência 
E nem sequer me resta a tua ausência, 
És um rosto de nojo e negação 
E eu fecho os olhos para não te ver. 
Nunca mais servirei senhor que possa morrer. 


Sophia de Mello Breyner Andresen
in Mar Novo - I e II - (1958)

Nenhum comentário:

Postar um comentário